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      Luis Mauro Filho

      Luis Mauro Filho é jornalista, formado em Estudos de Mídia pela Universidade do Wisconsin, e é editor do Brasil 247.

      21 artigos

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      Europa se rearma, mas não se encontra

      Oitenta anos após o fim da Segunda Guerra, UE lança plano bilionário de defesa sem consenso político, nem rumo claro na geopolítica global

      Bandeiras da UE na sede da Comissão Europeia em Bruxelas - 20/04/2016 (Foto: REUTERS/Francois Lenoir)

      Maio de 2025 marca os 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial — conflito que teve a Europa como palco central de uma disputa feroz por territórios, mercados e poder global. adas oito décadas da retomada de Berlim pela URSS, o continente volta a respirar o ar tenso de uma nova corrida armamentista. 

      A guerra na Ucrânia, a perda de protagonismo econômico e a instabilidade da aliança com os EUA empurram a União Europeia para uma tentativa de reconstrução de sua capacidade de defesa. Mas a pressa esbarra em divisões internas, problemas fiscais e um vácuo estratégico.

      O estopim dessa guinada foi a política externa de Donald Trump. De volta à Casa Branca em seu segundo mandato, o presidente norte-americano abandonou a retórica de compromisso com os aliados europeus, suspendeu a ajuda militar à Ucrânia e sinalizou desinteresse em liderar a OTAN como antes. Sem o “guarda-chuva” americano, a UE se viu exposta — e decidiu, de alguma forma, agir.

      A resposta foi o lançamento do plano ReArm Europe, anunciado por Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia. O pacote prevê mais de 800 bilhões de euros em investimentos nos próximos anos, com foco na modernização militar, fortalecimento da indústria bélica continental e maior autonomia em relação aos EUA. A proposta inclui o uso de empréstimos do Banco Europeu de Investimentos, redirecionamento de fundos regionais e flexibilização de regras fiscais, permitindo que gastos militares fiquem fora dos cálculos de déficit público.

      Na teoria, o plano quer garantir soberania, proteger o território europeu de ameaças e reaquecer economias estagnadas por meio de um “desenvolvimentismo militarista”. Na prática, no entanto, faltam fontes sólidas de financiamento e há risco de o custo recair sobre políticas sociais, com cortes em pensões e gastos públicos.

      O projeto escancara uma fragilidade mais profunda: a incapacidade da União Europeia de construir uma política externa coesa. A França de Emmanuel Macron defende uma autonomia estratégica, inclusive oferecendo seu “guarda-chuva nuclear” aos vizinhos. A Alemanha, maior economia do bloco, mira o plano como alavanca para recuperar sua indústria, mas enfrenta entraves históricos e resistência interna. Já a primeira-ministra italiana, Giorgia Meloni, ecoa o trumpismo: em visita à Casa Branca, prometeu “fazer a Europa grande novamente”, sinalizando uma postura mais alinhada aos EUA do que à própria UE.

      Enquanto isso, o Reino Unido, fora da União desde o Brexit, segue na OTAN e negocia acordos de cooperação com Bruxelas — mas ainda sem resultados concretos.

      No campo militar, os imes aumentam. França e Reino Unido pressionam pelo envio contínuo de armas à Ucrânia, apesar da evidente exaustão do exército ucraniano. Especialistas alertam que manter o conflito sem perspectivas reais de vitória pode levar a uma escalada direta com a Rússia. O rearmamento da Europa, ao invés de garantir segurança, pode acelerar uma nova fase de instabilidade no continente.

      E não é só a guerra que preocupa. O plano de defesa compete com outras urgências estratégicas. Em abril, um apagão de grandes proporções na Península Ibérica expôs a fragilidade da infraestrutura elétrica europeia. Com a transição energética acelerada, baseada em fontes intermitentes como solar e eólica, falta capacidade de armazenamento e interconexão entre os países. Investir em segurança energética e redes modernas parece tão necessário quanto rearmar exércitos.

      No campo tecnológico, o retrato é ainda mais alarmante. A Europa perdeu terreno nas inovações de ponta. Em 2024, os Estados Unidos produziram mais de 40 modelos de inteligência artificial avançada, enquanto a Europa não ou de cinco. A China avança rapidamente em semicondutores, robótica e tecnologias verdes. A UE, que já foi referência em ciência e indústria, agora corre atrás — e com fôlego curto.

      O diagnóstico é claro: a Europa envelheceu, perdeu dinamismo e se acostumou à proteção americana, sem desenvolver autonomia real. O plano de 800 bilhões em defesa é uma tentativa de mudar essa trajetória. Mas, sem consenso político, sem estratégia externa clara e com sua população ainda apegada a um modelo de Estado de bem-estar, o bloco corre o risco de investir pesado e continuar à margem da geopolítica global.

      Algumas lideranças defendem que a UE busque parcerias alternativas, como a China. Em julho, está prevista uma missão oficial a Pequim, liderada por Von der Leyen. O país asiático, interessado em diversificar seus parceiros e desafiar a hegemonia americana, acena com acordos comerciais e tecnológicos. Uma aproximação com Pequim poderia ajudar a modernizar o parque industrial europeu e abrir mercados, mas coloca em xeque o equilíbrio geopolítico da Europa entre Ocidente e Oriente.

      Mais do que escolher lados, o desafio da União Europeia em 2025 é reencontrar um propósito comum. Entre tanques, apagões e algoritmos, o continente precisa decidir o que quer ser nas próximas décadas: uma potência autônoma, com identidade estratégica própria, ou um coadjuvante, saudoso do ado.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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