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      Racismo estrutural compromete saúde mental de negros no Brasil, alerta psicanalista

      Casos recentes de discriminação racial reacendem debate sobre o sofrimento psíquico da população negra

      Maria Lúcia da Silva (Foto: Arquivo pessoal )

      247 - Casos de racismo registrados recentemente em São Paulo e Alagoas expam mais uma vez os efeitos devastadores da discriminação racial sobre a saúde mental da população negra. A repercussão de episódios envolvendo uma aluna do tradicional Colégio Mackenzie, encontrada desacordada após sofrer ataques racistas, e a demissão da jovem Gabriela Barros por usar tranças no cabelo, reacenderam o debate sobre como o racismo, mais do que um ato de preconceito isolado, é uma engrenagem permanente de sofrimento psicológico e exclusão social.

      Em entrevista ao Portal CUT, a psicóloga e psicanalista Maria Lúcia da Silva, especialista em saúde mental da população negra, alerta que o racismo estrutural opera como um fator contínuo de adoecimento psíquico. “Não se trata apenas de episódios isolados, mas de um modo contínuo de existir em uma sociedade que nega humanidade, voz e pertencimento às pessoas negras”, afirmou a psicanalista, que também é cofundadora do AMMA Psique e Negritude.

      Segundo ela, o impacto se manifesta de diversas formas: estresse crônico, ansiedade, depressão, síndrome do pânico e um sofrimento psíquico difuso que, muitas vezes, nem chega a ser diagnosticado corretamente. “O racismo age como um trauma crônico. Cada criança negra que nasce já vem inscrita com significados que o racismo produziu”, destacou.

      Casos concretos de violência simbólica e institucional

      No Colégio Mackenzie, localizado em Higienópolis, bairro nobre da capital paulista, uma estudante de 15 anos foi encontrada desmaiada no banheiro após sofrer bullying e ataques racistas contínuos desde 2024. Em outro caso, a alagoana Gabriela Barros, de 21 anos, foi demitida de seu emprego por usar tranças — uma expressão estética ancestral da cultura negra. A empresa alegou que o uso do penteado contrariava uma “regra interna”. Gabriela levou o caso à Justiça do Trabalho. 

      Esses episódios não são exceções. Dados do Ministério da Saúde revelam que jovens negros de 10 a 29 anos têm 45% mais risco de suicídio do que brancos da mesma faixa etária, sendo os homens negros os mais vulneráveis. O índice entre a população negra subiu 12% nos últimos anos, enquanto se manteve estável entre brancos.

      Racismo internalizado e autoestima fragmentada

      Maria Lúcia explica que o racismo internalizado é um dos fenômenos mais cruéis desse processo. “A pessoa negra incorpora os valores da branquitude como medida de valor. Isso se manifesta em autodepreciação, desejo de embranquecimento, vergonha da própria aparência e história.”

      Com base nos estudos do pensador Frantz Fanon, a psicanalista afirma que essa internalização do olhar do opressor leva à fragmentação psíquica e ao adoecimento silencioso. “O negro, ao se ver pelos olhos do colonizador, muitas vezes adoece por não se reconhecer como sujeito pleno”, afirma.

      Ambiente escolar e profissional como gatilhos

      Ambientes como escolas e locais de trabalho, fundamentais para o desenvolvimento e a identidade social, muitas vezes se tornam espaços de silenciamento, exclusão ou hipervigilância racial. “Esses espaços, que deveriam promover pertencimento, acabam funcionando como dispositivos de sofrimento para a população negra”, alerta Maria Lúcia.

      Ela acrescenta que a jovem do Mackenzie “não adoeceu por fragilidade, mas por necessidade de sobrevivência em um ambiente hostil e intolerante”. Para a psicanalista, a repetição diária de microagressões pode ser tão devastadora quanto agressões explícitas.

      Políticas públicas e formação antirracista são urgentes

      Para enfrentar esse quadro alarmante, a psicanalista defende a implementação efetiva da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra, com reconhecimento do racismo como determinante social de saúde. Isso inclui:

      Formação antirracista de profissionais da saúde;

      Inclusão de psicólogas e psicanalistas negras nos atendimentos públicos;

      Programas de cuidado para juventudes negras;

      Articulação entre saúde, cultura e ancestralidade como caminho terapêutico.

      “A saúde mental não pode ser pensada fora das relações de poder racializadas. O sistema de saúde precisa escutar o sofrimento racial sem patologizá-lo ou individualizá-lo”, afirma.

      O papel transformador da escola e da comunidade

      Maria Lúcia também aponta caminhos dentro da educação. Segundo ela, a escola deve ser espaço de “construção simbólica, e não de aniquilação subjetiva”. Por isso, defende a implementação efetiva da Lei 10.639/03, que torna obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira, e a criação de protocolos de acolhimento para situações de racismo, com escuta qualificada e responsabilização institucional.

      Por fim, destaca o papel dos coletivos negros e movimentos sociais, que atuam como espaços de cura e reconstrução simbólica. “São fontes de vida, reparação e memória. Ao nomear o racismo, saímos da solidão e produzimos conhecimento e dignidade.”

      A entrevista da psicanalista reforça a urgência de medidas institucionais e sociais para enfrentar os efeitos do racismo na saúde mental da população negra. Trata-se de uma questão de justiça, dignidade e reparação histórica, que só poderá ser superada com mudança estrutural, política pública eficaz e compromisso antirracista de toda a sociedade.

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