Turquia negocia com curdos da Síria e PKK para encerrar conflito armado
Negociações buscam desmobilizar o PKK e reintegrar forças curdas ao Exército sírio sob controle de Damasco
247 - Autoridades da Turquia e lideranças curdas sírias vêm conduzindo, há vários meses, tratativas sigilosas que podem significar um ponto de inflexão no histórico de confrontos entre Ancara e os curdos da região.
Conforme revelou o site Al-Mayadeen, os diálogos têm como objetivo encerrar o conflito com o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) e rever a postura turca em relação à autonomia curda no norte da Síria.
Fontes ouvidas pela publicação revelaram que os diálogos ocorreram de forma paralela a uma retomada da interlocução entre autoridades turcas e Abdullah Ocalan, líder histórico do PKK, atualmente preso. Reuniões de alto nível com representantes curdos da Síria teriam acontecido em países como França e Suíça, especialmente após as eleições municipais turcas.
A guinada de postura do governo Recep Tayyip Erdogan surgiu no contexto de uma derrota eleitoral significativa para o Partido Republicano do Povo (CHP), que contou com apoio do pró-curdo Partido da Igualdade e Democracia (DEM). Buscando enfraquecer esse bloco opositor, o governo turco ou a considerar alianças alternativas, inclusive com setores antes hostilizados.
Ocalan defende desarmamento e propõe novo partido
A nova etapa de diálogo ganhou força após o líder do ultranacionalista Partido do Movimento Nacionalista (MHP), Devlet Bahçeli — aliado de Erdogan — abandonar sua histórica resistência ao envolvimento curdo. Ele ou a apoiar a participação de Ocalan nas tratativas, chegando a itir publicamente a possibilidade de uma anistia, caso o PKK abandone as armas.
No dia 27 de fevereiro, Ocalan conclamou sua organização a encerrar a luta armada e se dissolver. A cúpula do PKK, sediada na região do Curdistão iraquiano, acatou a decisão em maio. Simultaneamente, o líder curdo ou a conduzir um processo de reestruturação do DEM, transformando-o numa legenda curda legalista, integrada à política institucional turca e com limites definidos pelo Estado.
Caso se concretize, esse desfecho representaria o fim de um ciclo de violência que se arrasta há mais de quatro décadas.
Novo realinhamento político e militar no norte da Síria
Apesar das continuadas operações militares contra alvos do PKK e da infraestrutura curda na Síria, Ancara tem reduzido suas ofensivas desde março. Um cessar-fogo intermediado pelos Estados Unidos, especialmente nas imediações da represa de Tishreen, permanece em vigor há mais de dois meses.
Como parte das medidas de distensão, o governo turco avalia reabrir o posto de fronteira de Nusaybin — fechado desde 2012. A reativação traria impactos econômicos diretos para regiões sob controle das Forças Democráticas Sírias (SDF), como Raqqa e Deir Ezzor.
Segundo fontes do Al-Mayadeen, Ancara estaria disposta a aceitar uma forma limitada de autonomia curda na Síria, desde que essa não seja institucionalizada por meio da Constituição. Além disso, haveria disposição para incorporar os combatentes curdos das SDF ao Exército sírio, sob comando de Damasco, conforme acertado em 10 de março entre o comandante Mazlum Kobane e o presidente interino sírio Ahmad al-Sharaa.
Kobane confirma cessar-fogo e ite possibilidade de diálogo com Ancara
O comandante das SDF, Mazlum Kobane, reconheceu publicamente a existência de uma trégua com o exército turco, ainda que “condicional e temporária”, e afirmou esperar que o acordo se torne permanente. Ele também se declarou aberto a se reunir com Erdogan, embora tenha itido que não há encontros marcados até o momento.
Fontes indicam que Kobane teria sido sondado para uma possível reunião com o ministro turco das Relações Exteriores, Hakan Fidan, ou com o chefe da inteligência Ibrahim Kalin, em Damasco — caso seja retirada toda a influência do PKK da política curda síria. Tanto a chancelaria turca quanto as SDF negaram formalmente que tal convite tenha sido feito.
Washington atua nos bastidores por uma saída negociada
As movimentações diplomáticas ganharam impulso com a mediação dos Estados Unidos, que facilitaram encontros entre representantes turcos e curdos no sul da Turquia. Nessas reuniões, temas como o futuro político da Síria, uma eventual retirada das tropas norte-americanas e o destino dos detentos do Estado Islâmico sob custódia curda estiveram na mesa.
O colapso do regime sírio de Bashar al-Assad em dezembro, bem como a aproximação recente entre a istração curda e o governo de Israel, funcionaram como catalisadores para uma maior cooperação entre Turquia e Síria — tradicionalmente em lados opostos do conflito.
Diante de um novo tabuleiro geopolítico no Oriente Médio, Erdogan parece apostar na via do pragmatismo para conter a influência curda transnacional e evitar que o vácuo de poder beneficie seus adversários — internos e externos.
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