Trégua tarifária EUA-China aponta para hegemonia americana em xeque
Acordo de 90 dias expõe recuo dos EUA e consolida a China como potência que resiste à pressão tarifária de Trump, aponta Luis Mauro Filho
A guerra tarifária patrocinada pelos Estados Unidos, sob o comando do presidente Donald Trump, ou por uma inflexão significativa após cerca de quarenta dias de vida.
Após semanas de escalada nas tensões comerciais, China e EUA anunciaram uma trégua parcial, reduzindo substancialmente as tarifas bilaterais.
O secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, confirmou a suspensão temporária das tarifas por 90 dias, a partir de 14 de maio. As tarifas americanas sobre produtos chineses caíram de 145% para 30%, enquanto as tarifas chinesas sobre produtos dos EUA foram reduzidas de 125% para 10%.
Esse desfecho ocorreu após a tentativa do governo Trump de pressionar a China a iniciar um diálogo em termos favoráveis aos EUA. Trump chegou a declarar que esperava uma ligação de Pequim propondo negociações, mas a resposta chinesa foi de firmeza e resistência.
O Ministério do Comércio da China destacou que as tarifas foram impostas unilateralmente por Washington e que qualquer conversa só seria viável com a retirada dessas medidas. Pequim não cedeu, e Trump viu-se forçado a buscar o alívio tarifário diante das consequências econômicas negativas da escalada que ele próprio provocou.
A resistência da China frustrou a expectativa da Casa Branca de que Pequim se mostraria disposta a recuar para evitar danos econômicos. Pelo contrário, o governo de Xi Jinping manteve uma postura sólida, recusando-se a negociar sob pressão e investindo em alternativas para mitigar os efeitos das tarifas, como estímulos domésticos e diversificação de mercados.
O presidente chinês também rejeitou tentativas de contato direto feitas por Trump.
A guerra tarifária provocou danos econômicos consideráveis. Nos EUA, as importações dispararam no início do ano em uma corrida para antecipar os efeitos das tarifas, gerando um déficit comercial recorde.
Como resultado, o Produto Interno Bruto americano encolheu 0,3% no primeiro trimestre de 2025 – um revés que não ocorria desde 2022. O Departamento de Comércio dos EUA itiu que o excesso de importações impactou negativamente o desempenho econômico. O resultado reforçou a percepção de que a estratégia tarifária de Trump foi mal calculada e teve efeito contrário ao desejado.
Na China, a contração do setor industrial também foi sentida. O índice PMI caiu para 49,0 em abril, indicando retração da atividade. Ainda assim, o país demonstrou maior resiliência, sustentando sua economia por meio de políticas fiscais e monetárias de estímulo.
A expectativa de crescimento, no entanto, foi revista para 3,5% ao ano – abaixo do padrão chinês dos últimos anos. Mesmo com as dificuldades, analistas destacam que a China saiu fortalecida do embate por não ter cedido à pressão americana.
A trégua firmada representa, portanto, uma vitória tática da China. Analistas observaram que os EUA acabaram atendendo à maioria das exigências de Pequim, inclusive suspendendo a tarifa extra de 34% imposta unilateralmente em abril.
Washington também aceitou criar um canal permanente de negociação, como queria o governo chinês. Além disso, comprometeu-se a trabalhar conjuntamente em questões como o combate ao tráfico de fentanil, vinculadas indiretamente às tarifas.
Esse cenário revela uma mudança na correlação de forças entre as duas maiores economias do planeta.
O episódio aponta, simbolicamente, para um ponto de inflexão na hegemonia econômica e, portanto, política, dos Estados Unidos.
A capacidade americana de impor sua vontade de forma unilateral e ditar os termos do comércio global mostrou-se enfraquecida. A necessidade de recuar e negociar em condições mais equilibradas com a China indica que o mundo caminha para uma ordem econômica mais multipolar, na qual Washington já não exerce o mesmo grau de liderança incontestável.
A trégua de 90 dias é, por ora, um alívio. Mas ela também carrega a certeza de que o paradigma da supremacia econômica americana não é mais absoluto.
Já a China, ao resistir, projetou-se como potência capaz de impor limites a Washington. O resultado deixa claro: o tarifaço não teve o alcance pretendido, e o símbolo de hegemonia mundial dos EUA sofre um desgaste visível. O que virá após esse intervalo provisório dependerá da disposição de ambas as potências para construir uma relação baseada em equilíbrio, e não em imposição.
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