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      Reynaldo José Aragon Gonçalves

      Reynaldo Aragon Gonçalves é jornalista e pesquisador do Núcleo de Estudos Estratégicos em Comunicação, Cognição e Computação (NEECCC) e do INCT em Disputas e Soberania Informacional.

      31 artigos

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      Por que toda operação da PF parece um roteiro repetido contra o governo Lula?

      'Escândalos, pânico moral e manchetes às vésperas de eleições formam um padrão de guerra híbrida disfarçada de zelo institucional', escreve Reynaldo Aragon

      Alessandro Stefanutto (Foto: Arquivo/Edilson Rodrigues/Agência Senado)

      A crise do INSS deflagrada nesta quarta-feira (23) não é apenas mais um escândalo istrativo: é um sintoma de algo muito maior e muito mais antigo. Quando a Polícia Federal aparece em rede nacional, às 6h da manhã, com sirenes ligadas, mandados em mãos e câmeras estrategicamente posicionadas, o Brasil já sabe que não está diante de uma simples operação policial. Estamos diante de mais um capítulo do manual informal de guerra híbrida em território nacional. Um roteiro conhecido, ensaiado, e, infelizmente, eficaz. A operação “Sem Desconto” mobilizou manchetes, afastou servidores, levou à demissão do presidente do INSS e, principalmente, gerou um impacto político imediato no governo Lula  a pouco mais de um ano das eleições de 2026. Coincidência? Dificilmente.

      A verdade é que o Brasil tem uma tradição — que a tranquilamente por fora da Constituição de instituições de Estado que atuam como braços políticos de determinados interesses de classe. Polícia Federal, Judiciário, Ministérios Públicos, Controladorias e até autarquias técnicas têm, nos momentos mais delicados, servido aos interesses do que há de mais reacionário nas elites econômicas, midiáticas e geopolíticas. Foi assim no Mensalão, com ministros do STF que ultraaram os limites processuais para condenar sem provas com base na “teoria do domínio do fato”. Foi assim com a Lava Jato, com seu espetáculo midiático, prisões seletivas, acordos internacionais obscuros e delações premiadas costuradas com afinco. E foi assim no golpe contra Dilma Rousseff, legitimado por um Congresso corrompido, por uma mídia histérica e por promotores sedentos por manchetes.

      Agora, a história ensaia nova temporada. O enredo, embora reciclado, é eficiente: escândalo + mídia + aparato policial + pânico moral + desgaste do governo. A fórmula da guerra psicológica não mudou. O que mudou, talvez, seja a sofisticação do jogo e a urgência em seu cronograma — afinal, 2026 se aproxima. E os inimigos da soberania nacional não dormem.

      HISTÓRICO DE INTERVENÇÕES INSTITUCIONAIS

      O Brasil não é um país onde as instituições funcionam com neutralidade republicana. Ao contrário do que prega o bordão auto celebratório de certos setores da burocracia estatal, o que se observa há pelo menos duas décadas é um padrão: o uso de estruturas de Estado como instrumento de disputa política, quase sempre contra governos do campo progressista. Esse padrão não é conspiratório, é documentado.

      Comecemos pelo Mensalão, escândalo que explodiu em 2005, logo após o Brasil ter enterrado de vez a proposta da ALCA e ensaiar uma política externa soberana. O caso foi julgado por um Supremo Tribunal Federal pressionado pela mídia e movido por um furor moralista que ignorou garantias básicas. O ex-ministro Joaquim Barbosa, transformado em herói midiático, aplicou a controversa “teoria do domínio do fato” para condenar sem provas materiais nomes históricos do Partido dos Trabalhadores. A espetacularização do julgamento, com sessões televisionadas ao vivo e manchetes diárias, não apenas serviu para desmoralizar o partido no poder, como também pavimentou o caminho para a aceitação de novas intervenções institucionais no futuro.

      Esse futuro chegou com a Operação Lava Jato. Criada em 2014 sob o pretexto de combater a corrupção na Petrobras, a operação se tornou um instrumento geopolítico de destruição seletiva. Ministros, executivos, empreiteiras, estatais e toda uma cadeia do projeto nacional-desenvolvimentista foram desmantelados com o apoio de setores do Ministério Público, da Polícia Federal, da Receita e do Judiciário. Tudo em diálogo com agências estrangeiras, o que já deveria, por si só, ter causado escândalo. Mas o que teve foi aplauso da mídia e silêncio institucional.

      A aliança entre a Lava Jato, o Departamento de Justiça dos EUA e organizações como a Transparência Internacional foi revelada por diversas investigações jornalísticas. A Pública e o UOL divulgaram documentos que mostravam como a ONG atuava diretamente na redação de acordos de leniência e celebrava, em eventos públicos, o modelo Curitiba de atuação, ao lado de Deltan Dallagnol e Sérgio Moro. Em vez de vigilância e equilíbrio, vimos promiscuidade institucional e a legitimação da guerra jurídica e o lawfare como ferramenta de disputa política.

      Essa trajetória culminou no impeachment de Dilma Rousseff em 2016. O Judiciário lavou as mãos. O STF assistiu à farsa constitucional encenada por um Congresso presidido por Eduardo Cunha, réu em inúmeros processos e orquestrada por partidos que hoje integram o centrão fisiológico. O crime de responsabilidade nunca existiu, mas o ritual foi cumprido. Mais uma vez, as instituições “funcionaram”.

      Desde então, tornou-se quase normal ver operações da PF às vésperas de votações importantes, dossiês “vazados” seletivamente para a imprensa, decisões judiciais que atropelam prazos e princípios, e uma atuação coordenada entre setores da burocracia estatal e interesses de elites que temem qualquer projeto que fale em soberania, desenvolvimento ou redistribuição de renda.

      A atual operação contra o INSS repete os mesmos padrões. O momento político é delicado, o governo enfrenta dificuldades para aprovar pautas importantes e a mídia já começa a plantar a ideia de um “governo conivente com a corrupção”. Não importa que a operação trate de fraudes que, em grande parte, ocorreram entre 2019 e 2022 o auge do bolsonarismo no poder. O que importa é o espetáculo e o alvo: enfraquecer, mais uma vez, a legitimidade de um governo progressista.

      A Transparência Internacional e o teatro da moralidade seletiva.

      Em meio ao caos político e institucional dos últimos vinte anos no Brasil, um nome sempre surge com aura de neutralidade técnica e suposta autoridade ética: Transparência Internacional. O problema é que, quando se examina mais de perto a atuação da organização no país, especialmente durante os anos da Lava Jato, o que se vê é tudo, menos neutralidade. A entidade, que goza de prestígio em setores da mídia e junto a elites globais, atuou não apenas como observadora, mas como aliada direta dos operadores da guerra jurídica.

      Durante os anos mais intensos da Lava Jato, representantes da ONG participaram de eventos públicos ao lado de Deltan Dallagnol e outros membros da força-tarefa. Defendiam com entusiasmo o modelo Curitiba, enquanto omitiam completamente as ilegalidades que já vinham sendo denunciadas por juristas independentes, como os abusos de prisões preventivas, os vazamentos seletivos para a mídia e a colaboração direta com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos.

      Em 2020, a agência de jornalismo investigativo A Pública revelou documentos que demonstravam que a Transparência Internacional chegou a sugerir termos de acordos de leniência com o Ministério Público Federal, além de discutir estratégias jurídicas com procuradores envolvidos nas delações. O UOL também publicou documentos que mostram que essa parceria ia muito além da retórica pública de "apoio técnico". Era influência direta em decisões que afetaram profundamente a política e a economia brasileiras. Um ativismo institucional travestido de moralismo global.

      Não se trata aqui de negar a importância do combate à corrupção, mas de questionar quem define os alvos, quais os critérios usados e, principalmente, quem lucra politicamente com a erosão da confiança nas instituições. A mesma Transparência Internacional que silenciou sobre os crimes de Sergio Moro e os vazamentos ilegais da Lava Jato, hoje também pouco se manifesta sobre os desmandos da extrema-direita global, do trumpismo e de seus aliados. Seu radar moral parece bem calibrado para identificar escândalos seletivos, mas cegamente tolerante com o autoritarismo e a guerra híbrida em curso.

      Diante da atual operação que atinge o INSS, convém perguntar: qual será a postura da Transparência Internacional? Haverá comunicados indignados? Acompanhamento técnico? Ou, como de costume, o silêncio eloquente enquanto a narrativa da corrupção é novamente usada como arma de desgaste político seletivo?

      A operação de hoje no contexto político atual.

      A operação “Sem Desconto”, deflagrada pela Polícia Federal em 23 de abril de 2025, caiu como uma bomba sobre um governo que já enfrenta um campo minado diário. O escândalo dos descontos indevidos em benefícios do INSS, com estimativas que apontam para um rombo de mais de R$ 6 bilhões, repercutiu imediatamente na mídia, no Congresso e na opinião pública. A resposta do governo Lula foi rápida: demissão do presidente do INSS, cobrança de apuração rigorosa e manifestação de “profunda preocupação” do ministro Lewandowski. Mas, em meio à tempestade, uma pergunta legítima paira no ar: por que agora?

      A fraude, segundo a própria PF, ocorreu principalmente entre 2019 e 2022, justamente no governo de Jair Bolsonaro. Ainda assim, a operação foi detonada no momento em que o governo Lula enfrenta dificuldades para aprovar projetos estratégicos, sofre pressão da mídia corporativa, e vê crescer a articulação de figuras da extrema-direita nas redes e nas ruas. A poucos meses das eleições municipais de 2024 e com 2026 no horizonte, a narrativa de que “nada mudou” e que “a corrupção continua” volta a ocupar o centro do debate público. Quem ganha com isso?

      A história recente mostra que operações policiais e escândalos istrativos não ocorrem em vácuos institucionais. Elas ganham forma, ritmo e impacto dentro de um ecossistema onde mídia, judiciário, setores da polícia e think tanks reacionários atuam em sinergia. Não por coincidência, vemos novamente a tentativa de criar um ambiente de pânico moral, de descrença nas instituições, de paralisia política. O script é conhecido: repete-se a fórmula da crise permanente para inviabilizar qualquer projeto de Estado minimamente soberano, popular ou desenvolvimentista.

      Mesmo que não haja qualquer irregularidade formal na operação da PF, o timing e o enquadramento dado à notícia já são, por si só, elementos centrais de uma disputa simbólica. Como em outras ocasiões, a narrativa da corrupção generalizada, mesmo quando baseada em fatos anteriores ao atual governo, é mobilizada como ferramenta de desestabilização emocional, psicológica e política. A guerra híbrida contemporânea não precisa de tanques nas ruas; bastam manchetes, mandados e a máquina da suspeição operando sem freios.

      O governo Lula não pode ignorar o histórico. A democracia brasileira não sobreviveu impunemente ao que foram o Mensalão, a Lava Jato, o impeachment fraudulento de Dilma e a eleição de 2018 contaminada por fake news e lawfare. Em 2025, com a extrema-direita global reorganizada, financiada e sedenta por revanche, cada operação precisa ser lida também por seus efeitos, não apenas por seus pretextos. E se não aprendermos com o ado, ele voltará mais uma vez com roupa de escândalo e alma de golpe.

      Ou seja…

      A operação “Sem Desconto” é mais do que uma ação da Polícia Federal contra um esquema de descontos indevidos no INSS. Ela é também um sinal. Um daqueles sinais que, quando observados isoladamente, podem parecer apenas burocráticos, mas que, em conjunto com o histórico institucional do país, formam um padrão inquietante. No Brasil, operações policiais não são apenas medidas de correção istrativa; muitas vezes, são atos de coreografia política com efeitos devastadores na estabilidade democrática.

      Do Mensalão à Lava Jato, do impeachment de Dilma às condenações sem provas que impediram Lula de disputar as eleições de 2018, vimos uma repetição de fórmulas que transformaram instituições do Estado em braços operacionais de projetos de poder antipopulares. E agora, em 2025, com um governo progressista no comando, mas sitiado por chantagens legislativas, sabotagens econômicas, campanhas de ódio digital e sabotagem midiática sistemática, é impossível ignorar os riscos de que o filme esteja sendo rebobinado mais uma vez.

      Não se trata de negar os fatos. O combate à corrupção é necessário. Mas se trata de perguntar: a quem interessa o espetáculo? Quem lucra com a erosão da credibilidade institucional sempre às vésperas de disputas eleitorais? E, sobretudo, quem define o enredo e escolhe os alvos?

      A imprensa progressista, os movimentos sociais e os setores democráticos do país não podem mais cair na armadilha da ingenuidade. O uso político das instituições de controle está em pleno funcionamento — e seu alvo, novamente, é o campo popular. Cada operação espetacularizada, cada manchete acusatória, cada vazamento seletivo é parte de uma engrenagem maior. Uma engrenagem que não se move sozinha, mas é dirigida com precisão por interesses que não se conformam com um Brasil soberano, redistributivo e popular. Em 2026, o Brasil será novamente testado. E se a esquerda democrática não enxergar com nitidez os mecanismos que estruturam essa guerra assimétrica, pode não haver tempo para outro alerta.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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