Greenpeace, JBS e o ecoterrorismo: Quando o mal se traveste do bem
Com apoio do investidor João Paulo Pacífico, ONG invadiu empresa brasileira para um protesto suspeito. Quem ganhou com essa manifestação?
João Paulo Pacífico é personagem recorrente de reportagens da imprensa corporativa como exemplo de milionário preocupado com questões socioambientais. Ele levou o MST para a bolsa de valores, num projeto que captou recursos para a produção agropecuária, uma iniciativa digna de elogios.
Este é um lado de Pacífico, mas há outros, menos destacados. Formado em engenharia, ele nunca trabalhou numa indústria. De família abastada, iniciou sua trajetória no mercado financeiro como funcionário da Rio Bravo, empresa de Gustavo Franco, um quadro do governo de Fernando Henrique Cardoso, de inequívoca orientação neoliberal.
Depois foi trabalhar num Banco Matone, que mais tarde seria vendido para a própria JBS, um negócio que gerou o Banco Original. Nessas reportagens, Pacífico diz que, num certo momento de sua vida, decidiu vender ativos de sua propriedade, por entender que milionários como ele prejudicam o planeta.
ite que continuou rico, mas diz ter doado o resultado da venda para entidades com projetos sociais. Não há por que duvidar da conversão de Pacífico, mas é preciso registrar que, exceto para a imprensa amiga, ele não gosta de falar sobre suas atividades atuais.
O Greenpeace informa que é de seu Conselho Fiscal no Brasil, e os perfis elogiosos publicados sobre ele dão conta de que recebeu R$ 10 milhões para investir em projetos de recuperação de pequenos agricultores no Rio de Grande do Sul, depois das chuvas que devastaram grande parte do Estado.
O investidor foi procurado por mim um dia depois da invasão da JBS por militantes do Greenpeace, seis deles argentinos. Havia a suspeita de que ele próprio havia levado parte dos militantes em seu carro, fazendo uso de sua condição de acionista da empresa.
Enviei 12 perguntas (abaixo), mas ele só respondeu uma, parcialmente, e ficou de dar as demais respostas no dia seguinte. Não o fez e ignorou minhas novas mensagens.
“João Paulo Pacífico, boa tarde. Td bem? Sou repórter do Brasil 247 e estou apurando a história da invasão da JBS pelo Greenpeace, uma ação que pode ser classificada como ecoterrorismo. Como você trabalhou no Banco Matone, que mais tarde seria comprado pelo grupo JBS, e é do Conselho Fiscal do Greenpeace, seu parceiro em investimento do Rio Grande do Sul, creio que é pertinente lhe enviar algumas perguntas. É o que farei, na expectativa de receber as respostas. Desde já, muito obrigado”, escrevi.
Cinquenta minutos depois, ele postou a seguinte mensagem pelo WhatsApp:
Oi Joaquim, tudo bem? Muito obrigado por enviar essa mensagem. Explico com o maior prazer, não só escrito, mas podemos falar tb. Vim hoje pra Goiânia para festa do meu sobrinho/afilhado. Hoje, por ser o dia da festa, está mais difícil. Mas amanhã, se a gente conseguir encaixar um horário, falamos. Pode ser? Em tendo tempo, te repondo hoje a noite, mas não consigo garantir. Pensei uma coisa rápida aqui… em relação a questão da ajuda ao Rio Grande do Sul. Posso te conectar com o Frei Sérgio do MPA (movimento dos pequenos agricultores). Eles que operacionalizaram tudo… situação devastadora. Captamos cerca de 3 milhões em doações, dos quais o Greenpeace investiu 3% do valor, o resto foi a mercado. Vou ver se acho um vídeo aqui explicando. Quando ninguém mais ajudava o RS, conseguimos apoiar cooperativas de agricultores familiares que perderam tudo”, respondeu.
Apesar do tom cordial e da promessa de resposta, cessou o contato. Teria conversado com advogado? Se sim, por quê?
Invasão de propriedade é crime, com penas leves. No caso, a ação dos militantes do Greenpeace tem um efeito político negativo para a imagem dele. Em primeiro lugar, por que falta substância ao protesto.
A porta-voz do Greenpeace, Cristiane Mazzetti, levada pelo investidor ao interior da empresa, fez uma transmissão ao vivo em que acusa a JBS de “cozinhar o planeta” , ou seja, adjetiva a mensagem, mas não apresenta prova de que o grupo esteja desmatando ilegalmente.
Há um texto do próprio Greenpeace que diz que não é possível provar a responsabilidade da empresa na criação de gado em áreas desmatadas. Cita um caso específico, do Pará.
“Não é possível afirmar que os bois que saíram da fazenda Tiborna são os mesmos que foram abatidos pela JBS. Entretanto, sem o controle total da cadeia de fornecedores, há grande chance de haver uma contaminação por desmatamento no abastecimento de carne desse frigorífico”, afirmou.
Houve outro caso, de 2022, em que um fazendeiro de Rondônia vendeu indiretamente para a JBS gado criado em área desmatada. O Repórter Brasil contou a história e a empresa respondeu que descredenciou os envolvidos.
“Diante dessa fraude, a JBS bloqueou a Agropecuária Rio Preto Eirelli, seus sócios e todas as pessoas a eles associadas, desligou os colaboradores envolvidos, e vai buscar reparação na Justiça pelos danos sofridos, além de comunicar outros atores do setor a respeito da atuação do grupo”, afirmou a empresa, em nota publicada pelo Repórter Brasil.
A JBS, que é a maior produtora de proteína animal do mundo, pressiona hoje o Ministério da Agricultura para adoção de medidas severas para rastreamento da produção de gado.
Faz isso por razão pragmática: a Europa, destino de grande parte de sua produção, ameaça deixar de comprar carne brasileira se não houver controle efetivo da produção, para que haja certeza de que o gado não foi criado em área de proteção ambiental.
Se esses são fatos conhecidos, por que o Greenpeace escolheu a JBS para protestar? Aí surge a suspeita de razão econômica.
Uma semana antes do protesto, a empresa teve aprovada a solicitação para a chamada dupla listagem, ou seja, terá ações negociadas nos EUA, além do Brasil, onde se consolidou como uma das dez maiores companhias de capital aberto.
A porta-voz do grupo citou este fato em sua transmissão feita após a invasão. No caso dela, a bordo do carro do investidor. No caso de outros militantes, pulando o muro.
“A JBS, para piorar, ainda teve uma luz verde dos Estados Unidos para listar as suas ações lá na Bolsa de Nova York”, discursou.
“Qual é o problema disso? Por que a sociedade civil se opõe a esse movimento?”, indaga, para em seguida responder: “Porque é uma empresa que é calcada num histórico de violações socioambientais e, ao conseguir captar dinheiro também na Bolsa de Nova York, ela vai ter mais recurso para expandir seu modelo de negócios, que é muito perverso para o meio ambiente, vai deixar os irmãos Batista ainda mais bilionários e, por isso, os reguladores devem intervir e barrar esse processo.”
Pode estar aí a motivação do protesto. Os competidores da JBS nos Estados Unidos certamente não querem a empresa vendendo ações lá para os norte-americanos.
Apenas JBS que perderia, caso uma sugestão da porta-voz do Greenpeace fosse aceita? Não. Perderia o Brasil todo, já que nosso principal banco de fomento, o BNDES, é sócio da empresa, e tem interesses na valorização de seus ativos, e também em seus dividendos, necessários para financiar o desenvolvimento econômico e social do País.
Seguem as perguntas enviadas a Pacífico:
Primeiramente, gostaria de saber é acionista da JBS e, sendo-o ou não, como viu a invasão de uma empresa privada sobre a qual nem o Greenpeace tem certeza de ligação com criadores de gado que fazem desmatamento ilegal na Amazônia?
2) Como conselheiro do Greenpeace, como viu a invasão?
3) Você esteve na Assembleia de Acionistas da JBS?
4) Foi informado de que ocorreria a Assembleia e, respeitosamente, pergunto se informou a seus parceiros do Greenpeace?
5) Como conselheiro do Greenpeace, soube que haveria ação na sede do grupo?
6) Se esteve na Assembleia, levou algum militante do Greenpeace em seu carro?
7) Você já recebeu algum recurso do Greenpeace? Há o caso do Rio Grande do Sul, público, mas pergunto se recebeu outros recursos para operações financeiras.
8) Você já doou algum recurso para o Greenpeace?
9) Respeitosamente, pergunto se ajudou a financiar a ação do Greenpeace na JBS.
10) Você se comunicou antes, durante ou depois da Assembleia na JBS?
11) Sempre respeitosamente, pergunto se soube com antecedência que haveria a ação do Greenpeace na JBS.
12) Você pode fornecer os nomes e os contatos dos agricultores que você e o Greenpeace apoiaram no Rio Grande do Sul?
Lembro que todas as perguntas são pertinentes tendo em vista sua relação com a ONG e também o vínculo anterior com o banco Matone.
Um abraço.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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