Ganhadora do Prêmio Jabuti denuncia abandono de haitianos no Brasil e propõe rede de solidariedade
Maria Valéria Rezende narra à TV 247 histórias de estudantes haitianos em situação crítica e defende cidadania como saída para crise humanitária
247 - Em conversa com Regina Zappa no programa Estação Sabiá, da TV 247, a escritora e educadora popular Maria Valéria Rezende lançou um alerta comovente: jovens haitianos que vieram ao Brasil para estudar vivem hoje em situação de abandono, sem documentos, empregos ou qualquer perspectiva. “Eles são pessoas fantásticas, impressionantes pela força de vontade e pela capacidade de luta”, afirmou, ao pedir que o governo brasileiro atue para facilitar o processo de nacionalização.A autora de Quarenta Dias, ganhadora do Prêmio Jabuti, revelou sua ligação profunda com o Haiti, iniciada nos anos 1990, quando trabalhou no país a convite da organização pacifista American Friends Service Committee, promovendo a formação de educadores populares com base na pedagogia de Paulo Freire. “Conheci o Haiti de ponta a ponta. A esperança naquela época era imensa”, lembra.
Da solidariedade à urgência
Ao longo da entrevista, Maria Valéria detalhou o envolvimento com jovens haitianos que vieram estudar no Brasil graças a bolsas oferecidas durante os governos petistas. Muitos deles, segundo ela, encontraram em João Pessoa, na Paraíba, apoio afetivo, pedagógico e, por vezes, abrigo em sua própria casa.
O cenário, no entanto, se agravou com o ar dos anos. “Eles estão sem aporte, não conseguem a renovação, e muitos perderam o visto de permanência. Sem isso, não podem trabalhar, não podem voltar ao Haiti e não conseguem sequer fazer concursos públicos aqui”, denunciou. A escritora contou o caso de Mac, um dentista que atuava em pequenas cidades do interior do Ceará. Com a troca de governo municipal, foi demitido e hoje está desempregado, endividado e impossibilitado de exercer sua profissão.
“A burocracia é cruel”, resume. “Eles tentam a naturalização, mas qualquer erro no processo os faz voltar à estaca zero. Um amigo teve que recomeçar tudo porque entregou um documento não juramentado. E são pessoas que já contribuíram muito para o Brasil, inclusive em regiões onde os brasileiros não querem trabalhar.”
Um fundo de apoio permanente
Um dos momentos mais emocionantes da entrevista foi o relato de Medine, jovem haitiana que perdeu a chance de cursar medicina ao não conseguir realizar a prova final do curso de português na véspera do terremoto que devastou o Haiti. Sem notícias da mãe, transtornada, não conseguiu sequer falar durante o exame. “Pagamos por muito tempo uma faculdade particular para ela não perder o visto. Agora ela está perto de se formar em medicina”, contou Valéria.
Medine conseguiu recentemente arrecadar recursos para trazer a mãe ao Brasil e propôs à escritora transformar o saldo restante da campanha em um fundo permanente de ajuda a outros haitianos. “É uma tragédia humanitária. E pouca gente sabe. Eles não têm saída, não podem voltar, não podem ficar. Estamos articulando uma forma de ajudar coletivamente e também de sensibilizar o governo federal.”
Maria Valéria destacou ainda o peso do preconceito racial como obstáculo para a inserção desses jovens no mercado de trabalho: “Mesmo altamente qualificados, muitos enfrentam racismo e desconfiança. Um dentista negro haitiano não é bem recebido em um consultório de cidade grande. Isso é real e precisa ser enfrentado”.
Apelo ao governo e à sociedade
Ao final do programa, Valéria fez um apelo público: “Se alguém que nos ouve tem alguma influência no governo, precisamos facilitar a nacionalização dos haitianos refugiados. São pessoas que só querem viver, contribuir e ficar em paz. Eles merecem isso.” Assista:
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