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      José Álvaro de Lima Cardoso

      Economista

      230 artigos

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      Um mundo perigoso

      Rússia celebra 80 anos da vitória sobre o nazismo e envia mensagem de força ao Ocidente em meio à guerra na Ucrânia e sanções históricas

      Cerimônia de oferenda floral no Túmulo do Soldado Desconhecido - Jardim de Alexander, Muralha do Kremlin (Foto: Ricardo Stuckert/PR)

      Em 9 de maio de 2025, a Rússia celebrou os 80 anos da vitória sobre o nazismo na Grande Guerra Patriótica (1941-1945), ocasião em que a URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas), sacramentou a vitória sobre a Alemanha Nazista, em um dos eventos mais significativos da história. As comemorações foram marcadas por um profundo senso de memória coletiva, orgulho patriótico e mensagens geopolíticas contextualizadas pelo atual cenário internacional. Houve celebrações em todo o país. O evento central ocorreu na capital, Moscou, na Praça Vermelha, com um grande desfile militar exibindo equipamentos da Segunda Grande Guerra, assim como os muito modernos, que o país dispõe.

      O Dia da Vitória comemora a rendição da Alemanha nazista em 9 de maio de 1945, após a tomada de Berlim pelo Exército Vermelho. Estima-se que a URSS perdeu na guerra cerca de 27 milhões de vidas. O número, por si só, já revela a importância que tem a data para o povo russo (que perdeu 13,9 das 27 milhões de pessoas). Sem sombra de dúvidas, a vitória sobre os nazistas é um pilar da identidade nacional da Rússia, como seria para qualquer povo que tivesse o país invadido e perdido milhões de compatriotas em uma guerra contra uma força hostil. 

      A Rússia aproveitou as comemorações do dia da vitória para exibir sua capacidade bélica, política que cumpre vários papéis ao mesmo tempo. Do ponto de vista interno, reforça o orgulho nacional e a confiança nas condições das Forças Armadas. Promove também a coesão política interna, fundamental para um país de características continentais. Do ponto de vista internacional, as comemorações de 9 de maio, enviam sinais de força aos adversários, principalmente aos EUA, reafirmando que a Rússia, muito mais do que em 1941, está preparada para defender seu território. Essa sinalização é especialmente relevante neste momento, em que a Rússia enfrenta uma guerra na Ucrânia, e o maior número de sanções econômicas que um país já sofreu na história (16.500).  

      As comemorações na Rússia são particularmente importantes, neste momento em que o país sofre um bloqueio econômico e político histórico, e enfrenta um sentimento crescente de hostilidade dos países europeus. Os governos europeus, que aderiram à guerra na Ucrânia por absoluta subserviência aos EUA, vêm procurando nos últimos anos, principalmente a partir da Guerra na Ucrânia, hostilizar e condenar o país, como se este fosse o culpado de todas as mazelas do continente.   

      É conhecido que a ideologia e prática do regime nazista em relação aos eslavos se caracterizou pela intenção de eliminar ou subjugar ou explorar essas populações, visando expandir o Lebensraum ("espaço vital") alemão. Adolf Hitler, em inúmeras ocasiões defendeu que os eslavos não podiam se autogovernar e deveriam ser escravizados pelos arianos. O documento central que revela o plano de extermínio, expulsão e escravização dos eslavos foi o Generalplan Ost (Plano Geral do Leste). O plano, desenvolvido pelos nazistas entre 1939 e 1942, pretendia colonizar e germanizar a Europa Oriental após uma vitória na Segunda Guerra Mundial. Entre alguns dos seus principais aspectos estava a remoção forçada ou o extermínio de milhões de eslavos, judeus, ciganos e outros considerados "racialmente indesejáveis". 

      O governo e a população da Rússia têm clareza que a invasão da União Soviética pela Alemanha nazista em junho de 1941 foi motivada por interesses de domínio de recursos e territórios, mas também pelo aspecto racista. Hitler e seus comandantes afirmavam que o "bolchevismo" fazia parte de uma conspiração judaico-eslava que precisava ser eliminada. Apesar das dificuldades de aferição precisa do número de mortos na Segunda Guerra Mundial, calcula-se que entre os aproximadamente 27 milhões de soviéticos mortos, entre 13 e 15 milhões eram civis. Entre estes, as maiores causas das mortes eram a violência dos invasores, a fome, as políticas de extermínio, deportação e trabalhos forçados. A propaganda do comando nazista reforçava a imagem dos soviéticos, e dos eslavos em geral, como "sub-humanos", portanto não requeriam um tratamento civilizado. 

      Uma das preocupações que ficaram evidentes, por ocasião das comemorações da vitória sobre os nazistas, está relacionada com a distorção, nos últimos anos, dos fatos ligados à Segunda Grande Guerra. ados 80 anos do final do conflito, há gerações na Europa completamente ignorantes sobre os acontecimentos históricos daquele período, e que acreditam em qualquer coisa, inclusive que Hitler e Stalin seriam, ao fim e ao cabo, a mesma coisa. A antipatia em relação à figura de Stalin, não pode servir de pretexto para a manipulação da história. Podemos ter as maiores críticas sobre a figura de Stalin, que certamente cometeu inúmeros erros. Mas não se pode comparar seu papel na história com o de Adolf Hitler.  

      Há muita manipulação também em relação a como a guerra teria terminado. Membros do governo russo, mencionam pesquisas realizadas especialmente na França e no Reino Unido, que revelam que nos anos de 1950, apenas algum tempo após a guerra, quando perguntavam quem foi o principal responsável por derrotar a Alemanha nazista, a esmagadora maioria apontava a União Soviética. No entanto, ao longo das décadas, a política de propaganda da Guerra Fria, e a grande mídia, fizeram mudar completamente essa percepção. Em função dessa maciça propaganda, as pessoas pensam que foi o exército dos EUA que quebrou a espinha dorsal do fascismo, o que é de uma fantasia absoluta. 

      Os números falam por si: enquanto a União Soviética teve 27 milhões de mortos e um número de feridos entre 14,6 milhões e 17,6 milhões, os EUA tiveram aproximadamente 405.399 soldados que perderam a vida. Desse total, 291.557 morreram em combate e 113.842 por outras causas. Além disso, aproximadamente 670.846 soldados foram feridos durante o conflito. Estima-se que durante a Segunda Guerra Mundial, morreram entre 70 e 80 milhões de pessoas, aproximadamente 3% da população mundial da época. Nesse número estão incluídas tanto baixas militares quanto civis, caracterizando o conflito mais devastador da história humana. Morreram entre 20 e 25 milhões de militares e cerca de 50 a 55 milhões de civis, devido a genocídios, bombardeios, fome e doenças. Os países mais afetados foram: 

      • União Soviética: 27 milhões de mortos, incluindo militares e civis.
      • China: perdas estimadas entre 15 e 20 milhões de pessoas, majoritariamente civis.
      • Alemanha: entre 6 e 7 milhões de mortes.
      • Polônia: perdeu aproximadamente 5 a 6 milhões de pessoas, a maioria vítimas do Holocausto.
      • Japão: sofreu entre 2,5 e 3,1 milhões de mortes.

      Não foi por acaso que a China ocupou um lugar de honra na comemoração dos 80 anos da vitória sobre os nazistas. Os números variam a depender da fonte, mas segundo os próprios representantes do governo russo, a China teria perdido mais pessoas na guerra do que a União Soviética: 35 milhões. A invasão japonesa da China começou antes mesmo da Segunda Guerra, com o início da Guerra Sino-Japonesa, em 1937. A invasão japonesa à China foi um dos conflitos mais longos e brutais da Segunda Guerra. A resistência dos chineses foi muito importante para imobilizar uma parte expressiva das forças japonesas, influenciando o equilíbrio na guerra entre os Aliados e o Eixo. Apesar disso, a propaganda dominante na grande mídia, praticamente não menciona o papel da China na Segunda Guerra. 

      Em um artigo recente, publicado em maio, Xi Jinping comparou a "hegemonia" dos Estados Unidos às "forças fascistas" da Segunda Guerra Mundial. Segundo o presidente da China: "80 anos depois, o unilateralismo, a hegemonia e o bullying são extremamente prejudiciais. A humanidade está mais uma vez na encruzilhada”. 

      A declaração, feita em um momento em que Trump abriu fogo contra a China, através do tarifaço e de uma série de declarações tresloucadas, provocou reações hipocritamente indignadas dos governos dos EUA. 

      O cenário dessa polêmica é uma encruzilhada histórica, de fato, muito importante: a crise do imperialismo e a consolidação de um novo eixo de poder global, formado pelos países do BRICS, e com a liderança da China. Um sintoma desse cenário é o surgimento de grandes acontecimentos simultâneos, em curtos espaços de tempo, trazendo enormes incertezas. Ambiente no qual as decisões tomadas pelos países, possivelmente trarão consequências por décadas.

      A exemplo da Rússia, a China sofre no mundo todo o que Xi Jinping classifica no seu artigo como “bullying”, que na verdade é calúnia e difamação feitas em escala industrial e sem limites. A guerra da informação, como sempre, é encarniçada, mas a China tende a prevalecer, apesar do poderio do império americano (que não deve ser subestimado). O que irá, mais cedo ou mais tarde, garantir a vitória da China nessa disputa, são os fatos. A China não exporta só produtos, mas também sua capacidade produtiva, influenciando, cada vez mais, as cadeias globais de produção. Outro aspecto fundamental é a sua proposta de uma globalização diferente, fundamentada numa filosofia de "ganha-ganha", na direção contrária da política normal dos EUA cujo princípio é “nós ganhamos tudo, vocês perdem o que pudermos tomar”. No modelo de parceria proposto pela China, prevalecem a cooperação e a previsibilidade, e não interferências nas políticas internas dos países. 

      A história da China, nos últimos 59 anos, é o melhor testemunho do que representa o país. Desde as reformas de 1978, o país manteve taxas de crescimento entre 8% e 10% e, mesmo com a crise de 2008, prosseguiu como uma das economias de crescimento mais acelerado do mundo – desempenho insuperável entre as grandes economias. Nas últimas décadas, a China transformou o investimento público maciço em infraestrutura, logística e tecnologia em um de seus principais motores de desenvolvimento. A combinação de planejamento consistente e abrangente, assim como a continuidade das ações, possibilitou a saída da pobreza extrema, do maior número de pessoas na história conhecida, como vimos. Ademais, a política desenvolvida pela China nas últimas décadas, que transformou o país no motor industrial e tecnológico do planeta, ao mesmo tempo que melhorou a vida do seu povo, tem um componente imprescindível, que é a defesa intransigente de um projeto de país, nacional e soberano. 

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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