Setenta anos de Bandung: o renascimento do Sul Global
O Sul Global é um espaço de resistência e a cúpula China-Celac será um momento de afirmação do mundo multipolar
Há exatos 70 anos, entre os dias 18 e 24 de abril de 1955, líderes de 29 países asiáticos e africanos se reuniram na cidade de Bandung, na Indonésia, para dar origem a uma das mais importantes conferências da história moderna: a Conferência de Bandung. Mais do que um encontro diplomático, Bandung foi um grito de libertação contra o colonialismo, o imperialismo e a lógica da Guerra Fria que dividia o mundo em dois blocos liderados pelos Estados Unidos e pela União Soviética. Foi ali que nasceu o conceito de Terceiro Mundo como espaço de autonomia política e cooperação entre povos recém-libertos — e, com ele, a semente do que hoje chamamos de Sul Global.
Entre os líderes mais importantes daquele encontro estavam nomes que se tornariam símbolos da luta anticolonial e da afirmação da soberania nacional: Jawaharlal Nehru (Índia), Sukarno (Indonésia), Gamal Abdel Nasser (Egito), Kwame Nkrumah (Gana) e Zhou Enlai (China). Todos compartilhavam uma visão de mundo na qual os países emergentes não deveriam se submeter às potências dominantes, mas sim construir seus próprios caminhos de desenvolvimento e justiça social, através da solidariedade e da não-alinhamento.
Bandung foi um marco inaugural. Dela emergiu o Movimento dos Países Não Alinhados e uma nova consciência internacionalista. No entanto, a história não seguiu um percurso linear. Golpes de Estado — muitos deles articulados por potências ocidentais — como o de 1965 na própria Indonésia contra Sukarno, o de 1973 no Chile contra Salvador Allende, e, de forma ainda mais emblemática, o de 1964 no Brasil, que instaurou uma ditadura militar de 21 anos e alinhou o país aos interesses dos Estados Unidos, evidenciam o quanto a ordem internacional resiste à emancipação dos povos do Sul.
Apesar das contramarchas, o espírito de Bandung sobreviveu. Mais do que isso: hoje, setenta anos depois, ele renasce com força renovada, impulsionado pela ascensão dos BRICS e pelo aprofundamento da cooperação Sul-Sul. O mundo já não é mais bipolar, tampouco unipolar. Estamos diante de um novo cenário multipolar, no qual os países do Sul Global têm mais voz, mais poder de barganha e mais protagonismo.
Neste contexto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva é um herdeiro legítimo do legado de Bandung. Desde seu primeiro mandato, Lula sempre valorizou a integração entre países em desenvolvimento, promoveu o comércio entre nações do Sul, fortaleceu os BRICS e posicionou o Brasil como uma nação independente, comprometida com a justiça global. Em suas palavras e ações, Lula tem reafirmado o compromisso com um mundo mais equilibrado, onde a cooperação deva prevalecer sobre a dominação.
A próxima reunião China-Celac, marcada para o dia 13 de maio de 2025, será uma grande oportunidade para celebrar e reafirmar o espírito de Bandung. Este encontro reunirá a China e alguns países da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, demonstrando como a cooperação intercontinental do Sul Global pode gerar novas soluções para os desafios do nosso tempo: combate à pobreza, transição energética, soberania digital, reforma das instituições multilaterais.
A memória de Bandung nos ensina que o Sul Global não é um espaço de subalternidade, mas de resistência, criatividade e construção de alternativas. E hoje, com mais maturidade e instrumentos institucionais, os herdeiros de Bandung estão prontos para retomar esse projeto com ambição renovada. Que o aniversário de 70 anos da conferência inspire os líderes das nações emergentes a seguir adiante — com coragem, solidariedade e visão de futuro.
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