"Senti o abalo emocional": Glauber Braga completa 177 horas de greve de fome
Conversei com o deputado: ele já perdeu quase cinco quilos e sua voz está fraca, mas garante: "Não vou desistir”
Já era noite quando Glauber Braga surge no final do corredor, caminhando em direção ao Plenário 5 da Câmara dos Deputados, onde, na quarta-feira da semana ada, ocorreu a infame sessão em que, por 13 votos a cinco, os deputados da Comissão de Ética aprovaram o relatório que recomenda a cassação do parlamentar.
“É uma honra conhecer você pessoalmente", disse-me, generosamente, o deputado ao chegar à porta do Plenário, onde eu estava. Vestindo calça e moletom brancos, de máscara também branca, Glauber disse que assistiu aos documentários que realizei para a TV 247.
“Gosto muito dos seus documentários", afirmou. Perguntei se poderia gravar imagens dele no plenário, onde permanece em greve de fome desde aquela sessão. “Claro", disse, com uma voz enfraquecida, fruto de, naquele horário, 19 horas de terça-feira, 160 horas de greve de fome.
– Como você está? – perguntei.
– Estou bem - respondeu, e se encaminhou para a sala, que estava fechada com uma faixa de isolamento e com três policiais legislativos fazendo a segurança. Acompanhei o parlamentar, ele se dirigiu a um colchão com roupa de cama e se deitou, com olhar dirigido ao teto. Pouco depois, a luz se apaga, ele já estava de olhos fechados.
Na sala, permanecem alguns assessores, a maioria de máscara. Glauber iniciou a greve de fome com 91 quilos e setecentos gramas, um pouco acima do peso para quem tem estatura mediana, como ele. Na noite de terça-feira, seu peso era de 87 quilos e cem gramas.
Naquela tarde, Glauber recebeu as visitas de dois ministros do governo Lula, Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário, e Sônia Guajajara, dos Povos Originários. Também esteve lá o senador Jaques Wagner, líder do governo no Senado.
Hoje recebeu o Movimento Nacional de Direitos Humanos.

Glauber falou pouco. Segundo o boletim divulgado nesta quarta-feira pela manhã, ele disse que, nessas conversas, têm sido informados de que os parlamentares estão preocupados com as consequências que um possível processo de cassação possa resultar para a estrutura democrática no Parlamento.
“A preocupação dos parlamentares que têm vindo me visitar, de vários partidos, é quanto à possibilidade de cassação. Se fizerem isso comigo, quem será o próximo"> if (googletag && googletag.apiReady) { googletag.cmd.push(() => { googletag.display(id); }); }
“A decisão do Conselho de Ética de recomendar a cassação de Glauber Braga, mesmo diante de precedentes em que penalidades mais brandas foram aplicadas, indica uma interpretação mais rigorosa da quebra de decoro parlamentar neste caso específico”, pontuaram.
A nota é assinada por 25 juristas, entre os quais nomes de peso como o ex-reitor da UnB José Geraldo de Sousa Júnior, o desembargador Alfredo Attié, o ex-ministro da Justiça Tarso Genro, Antônio Carlos de Almeida Castro e Carol Proner.
Os juristas alertam para o fato de que a decisão do Conselho de Ética não respeitou o princípio da proporcionalidade da pena, consagrado pela jurisprudência do STF e STF, com base no inciso LIV (54) do artigo 5o. da Constituição Federal (“ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal").
Bingo. Se o plenário confirmar a decisão do Conselho de Ética, o caso, certamente, será levado para o STF, por envolver uma questão constitucional.
Glauber Braga completa, às 11h desta quarta-feira, 177 horas de greve de fome. Ele tem ingerido apenas soro, isotônico e água. Nesta noite, segundo o boletim divulgado por seu gabinete, Glauber dormiu cerca de quatro horas.
“Essa noite senti mais o abalo emocional. Dormi pouco, cerca de quatro horas. Acordei, pensei bastante e me sinto forte novamente. Não vou desistir', garantiu o deputado.
Glauber tem recebido acompanhamento médico duas vezes por dia e realizado exames a pedido da equipe médica. De acordo com o médico Antônio Alves, responsável pela última avaliação, os resultados dos exames de ureia, creatinina, sódio, potássio, cloro e glicemia estão dentro da normalidade.
“Ele (Glauber) referiu ter apresentado ontem cefaleia frontal leve que cedeu sem uso de analgésico, um mal-estar gastrointestinal, sem maiores consequências e dor nas costas. Hoje, o Glauber me revelou que hoje ele estava mais emotivo, mas disposto e bem orientado”, relatou o médico.
A greve de fome é um sofrimento que Glauber Braga impõe a si próprio com um objetivo nobre do ponto de vista político.
Já ocorreram outros casos parecidos com o de Glauber no Congresso brasileiro, inclusive com agressões entre parlamentares, e foram arquivados, como anotaram os juristas.
Por que com o deputado do PSOL tem sido diferente? A resposta é: Porque Glauber é um parlamentar combativo que não participa de conchavos. Ele denunciou o esquema das emendas, liderado pelo então presidente da Câmara, Arthur Lira.
A perseguição política é flagrante. Veja-se um caso que ocorreu em 2001. Inconformado com um livro que denunciava desmandos de Antônio Carlos Magalhães na Bahia, um deputado, sobrinho de ACM, agrediu o autor, Maneca Muniz, com socos e pontapés, no interior da Câmara.
O que aconteceu com ele? Nada. E o deputado em questão é Paulo Magalhães, o relator do processo do Conselho de Ética que decidiu pela cassação de Glauber Braga. Fosse ele o relator do caso de 2001, pelo fundamento expresso agora, teria cassado a si próprio.
Escandaloso, imoral e também estúpido. O relatório assinado por Paulo Magalhães abre as portas do inferno para todos os parlamentares. Ninguém mais estará seguro na casa.
Dois pesos e duas medidas indicam que não é o fato que é levado em consideração, mas os personagens envolvidos. Os parlamentares poderão cassar qualquer um, violando o princípio da soberania do voto.
A cada dia que a, os feiticeiros que prepararam a poção para punir Glauber veem se aproximar o dia em que eles próprios serão atirados ao caldeirão fervente.