Retrato de uma desigualdade abissal: as 10 maiores economias em 2025 — e também as 10 menores
O sofrimento de uma criança na Síria, na Etiópia ou no Brasil diz respeito a todos nós
Em uma década marcada por pandemias, guerras comerciais, revoluções digitais e crises climáticas, o desempenho das maiores economias do mundo revelou tanto resiliência quanto profundas desigualdades estruturais.
Dados divulgados pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) dão conta de mudanças notáveis no cenário global entre 2015 e 2025 — com algumas surpresas, ascensões promissoras e estagnações reveladoras.
Para entender os motores por trás desse crescimento — e as vulnerabilidades que ameaçam freá-lo — recorremos a uma ferramenta clássica da análise estratégica: o modelo conhecido pela sigla SWOT (em inglês: Strengths, Weaknesses, Opportunities, Threats), criado na década de 1960 na Universidade de Stanford.
Originalmente concebido para o mundo corporativo, ele se mostrou eficaz também na avaliação de países, pois permite sintetizar quatro dimensões essenciais de qualquer economia: o que ela faz bem, onde falha, que oportunidades têm diante de si e o que a ameaça no médio e longo prazo. Utilizá-lo neste artigo visa justamente facilitar a compreensão do leitor diante de realidades nacionais complexas, aproximando técnica e jornalismo.
Líderes do crescimento e a batalha pelo futuro econômico
A economia americana saltou de US$ 23,7 trilhões para US$ 30,3 trilhões. Seu principal motor é a força do mercado interno, impulsionado por inovação tecnológica, consumo elevado e políticas monetárias flexíveis.
- Pontos fortes: ecossistema de inovação (Silicon Valley, universidades de ponta)
- Fragilidades: dívida pública crescente e desigualdade social persistente
- Oportunidades: liderança global em inteligência artificial e transição verde
- Ameaças: polarização política e tensões com a China
Com crescimento de 74%, a China aproxima-se rapidamente dos EUA. A economia ou de US$ 11,2 trilhões para US$ 19,5 trilhões. Seu motor é a industrialização tecnológica, alavancada por planejamento estatal e forte investimento em infraestrutura e educação.
- Pontos fortes: planejamento de longo prazo e escala produtiva
- Fragilidades: bolhas imobiliárias e rigidez no mercado
- Oportunidades: expansão da energia limpa e comércio com o Sul Global
- Ameaças: disputas comerciais e envelhecimento populacional
Já a Alemanha (10%) e o Japão (6%) tiveram desempenhos modestos. Ambos seguem dependentes de setores industriais tradicionais e enfrentam dificuldades demográficas.
- Pontos fortes: excelência industrial e tecnológica
- Fragilidades: envelhecimento populacional e estagnação
- Oportunidades: reconversão verde das cadeias produtivas
- Ameaças: concorrência asiática e falta de mão de obra qualificada
A Índia deu, o que chamo de "o salto do milênio", uma vez que se destacou como o país que mais cresceu proporcionalmente: 77%. De US$ 2,4 trilhões em 2015 para US$ 4,3 trilhões em 2025, alavancada por serviços, tecnologia e uma população jovem.
- Pontos fortes: expansão digital e demografia favorável
- Fragilidades: desigualdade estrutural e carência em infraestrutura
- Oportunidades: polo global de TI e manufatura
- Ameaças: polarização política e conflitos religiosos
Brasil e os Emergentes: Oportunidades e Entraves
Com crescimento de apenas 8%, o Brasil ou de US$ 2,1 trilhões para US$ 2,3 trilhões. O país ainda depende fortemente de exportações de commodities e do agronegócio.
Como brasileiro, dedico uma atenção ampliada à análise do nosso país — não apenas por dever de ofício, mas por afeto e compromisso.
Com um crescimento modesto de apenas 8% entre 2015 e 2025, o Brasil viu seu PIB ar de US$ 2,1 trilhões para US$ 2,3 trilhões. Em comparação com países que compartilham o mesmo porte populacional e potencial, trata-se de uma estagnação.
· Pontos fortes:
Riqueza natural incomparável: O Brasil possui vastos recursos naturais — água doce, florestas tropicais, solo fértil, petróleo, minerais estratégicos. Poucos países do mundo têm esse patrimônio.
Diversidade agrícola e energética: O agronegócio brasileiro é competitivo em escala global, assim como a matriz energética que combina hidrelétricas, biomassa, energia eólica e sola
· Fragilidades:
Baixa produtividade e infraestrutura deficiente: A economia brasileira sofre com gargalos logísticos, excesso de burocracia e má gestão crônica, dificultando o aumento da eficiência.
Instabilidade institucional e sistema tributário caótico: A complexidade do sistema de impostos e a insegurança jurídica afugentam investimentos e alimentam a informalidade.
· Oportunidades:
Transição energética e economia verde: O mundo caminha para a sustentabilidade, e o Brasil está bem posicionado para liderar essa agenda — se houver vontade política e investimento em inovação.
Potencial em turismo ecológico e economia criativa: O Brasil reúne beleza natural, patrimônio cultural e diversidade artística que, bem aproveitados, podem gerar emprego, renda e inclusão social.
· Ameaças:
Desindustrialização e dependência de commodities: Enquanto as grandes potências caminham para a biotecnologia, inteligência artificial e ciência de ponta, o Brasil ainda é majoritariamente um exportador de bens primários — soja, minério de ferro, petróleo bruto.
Atraso científico e fuga de cérebros: Sem investimento sistemático em pesquisa e desenvolvimento, o país corre o risco de ficar de fora do boom tecnológico do século XXI, tornando-se irrelevante nas cadeias globais de valor.
Essa contradição é o grande dilema do Brasil: um país com todas as condições naturais para liderar o futuro, mas que insiste em operar no ado. A transição de uma economia extrativista para uma economia de conhecimento é urgente — ou perderemos o trem-bala da história mais uma vez. Nesse cenário temos a Turquia (59%) e a Indonésia (51%) como as grandes revelações entre os emergentes, aproveitando mercados internos vibrantes, localização estratégica e políticas públicas voltadas ao crescimento industrial. México (14%), Coreia do Sul (29%) e Canadá (17%) representam estabilidade relativa e inserção global com alto grau de sofisticação tecnológica ou integração continental.
Europa Ocidental: tradição com ritmo reduzido
França, Reino Unido, Itália e Espanha mantêm seu prestígio como potências históricas e protagonistas da diplomacia global, mas os índices de crescimento econômico entre 2015 e 2025 — oscilando entre 11% e 23% — expõem uma desaceleração estrutural que contrasta com o dinamismo de outras regiões. Essa performance modesta reflete não apenas o esgotamento de seus ciclos de industrialização clássicos, mas também a dificuldade em renovar sua base produtiva diante da transição digital e das novas exigências do mercado global. Apesar disso, essas nações continuam sendo centros de excelência acadêmica, com universidades de projeção internacional, elevado capital humano e modelos de proteção social que, embora pressionados, ainda são referência. Contudo, a sustentabilidade fiscal desses sistemas tem sido questionada por déficits crônicos, envelhecimento populacional e aumento da demanda por serviços públicos. Ao mesmo tempo, a crescente complexidade dos fluxos migratórios e o impacto das guerras comerciais e conflitos regionais impõem dilemas políticos e sociais difíceis de equacionar. Vemos a cada dia o velho modelo europeu de bem-estar e protagonismo político ser desafiado tanto por dentro quanto por fora: internamente, por uma crescente polarização ideológica e descontentamento social; externamente, pela ascensão das economias asiáticas e pela perda de influência no tabuleiro geopolítico. A reinvenção desses países exigirá reformas estruturais profundas, investimentos em inovação e uma nova visão estratégica que combine inclusão social com competitividade econômica num mundo em mutação acelerada.
As dez menores economias: pequenas ilhas, gigantescas vulnerabilidades
Tuvalu, Nauru, Kiribati, São Tomé e Príncipe, Comores, Palau, Ilhas Marshall, Micronésia, Ilhas Salomão e Vanuatu formam o grupo das dez menores economias do mundo, com PIBs variando entre US$ 63 milhões e US$ 450 milhões. Dependentes do turismo, de poucos produtos de exportação e de ajuda externa, essas nações enfrentam desafios climáticos severos, isolamento logístico e frágil infraestrutura estatal. São frágeis economias insulares, muitas delas ameaçadas de submergir com o avanço do nível do mar. Elas não apenas estão ausentes das grandes discussões econômicas — como frequentemente sequer são mencionadas.
Oceano de contrastes
Para ilustrar o abismo populacional, consideremos o Estádio do Maracanã, com capacidade para 78 mil espectadores. As dez maiores economias concentram cerca de 4,5 bilhões de pessoas — o equivalente a 57.700 Maracanãs lotados. Já as dez menores somam pouco mais de 2 milhões de habitantes, ou apenas 25 Maracanãs. Uma diferença que não é apenas numérica, mas geopolítica, tecnológica e, sobretudo, de dignidade. E aqui, surge o paradoxo: o planeta é um mesmo oceano, mas há quem o navegue em transatlânticos com sistemas de navegação automatizada e quem siga em botes improvisados, lutando para não ser tragado pelas ondas. Enfrentam as mesmas tempestades — pandemias, inflação, crises climáticas — mas com estruturas incomparáveis.
A imoralidade da disparidade: um só homem, um só mundo, mas...
Segundo a Forbes, em 2025, Elon Musk acumula uma fortuna de US$ 342 bilhões. Isso é mais de 13 vezes o PIB somado das dez menores economias do planeta — que juntas não am de US$ 25 bilhões. Se essas nações fossem uma só economia, Musk poderia, hipoteticamente, comprar toda a sua produção anual e ainda teria troco para financiar o envio de uma nova frota à Marte. Mais inquietante é pensar que, se ele decidisse gastar US$ 1 bilhão por mês com esses países, em pouco mais de dois anos e meio teria injetado mais dinheiro do que todos eles produzem anualmente. É como se um único indivíduo ocue uma cobertura de luxo com 130 quartos, enquanto milhões dividem barracos sob a mesma laje global. Essa desproporção, no fundo, não diz respeito apenas à economia. É um espelho ético. Revela um sistema global onde riqueza acumulada independe da necessidade coletiva, onde opulência e miséria convivem como vizinhas que não se cumprimentam.
Uma reflexão final
Desde os meus 16 anos, ei a ver o mundo como sendo um só país, e os 8,2 bilhões de habitantes como cidadãos desse hipotético país mundial. Porém, diante das disparidades econômicas e sociais que persistem, percebo que estamos há anos-luz de sermos verdadeiramente cidadãos desse único país chamado Terra. Minha utopia pessoal ainda parece distante, mas permanece como um ideal a ser perseguido. Essa visão amadureceu com o tempo, porque assim como os sonhos não envelhecem, isso que chamam utopia, também. É que continuo me alimentando por leituras, viagens, encontros interculturais e um desejo profundo de justiça social. Em cada rosto que encontro, percebo mais semelhanças do que diferenças. A diversidade de idiomas, culturas e religiões não nega a verdade essencial de que todos partilhamos o mesmo planeta, os mesmos recursos, os mesmos medos e esperanças. Na essência mais pura do que é ser humano, está o anseio por pertencimento, dignidade e paz. Por isso, a frase "a Terra é um só país e os seres humanos seus cidadãos" deixou de ser apenas uma máxima inspiradora e tornou-se, para mim, uma convicção ética e existencial. Ela não nega as fronteiras geográficas, mas desafia as barreiras mentais e emocionais que ainda separam os povos. É urgente repensarmos nossa identidade coletiva. A cidadania global não deve ser um privilégio, mas uma responsabilidade compartilhada. Quando percebermos que o sofrimento de uma criança na Síria, na Etiópia ou no Brasil diz respeito a todos nós, então talvez estejamos mais próximos de realizar essa utopia. Porque, afinal, se a Terra é um só país, o nosso desafio maior é tornarmo-nos dignos de sermos chamados seus cidadãos.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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