PT sem discurso para a campanha de 2026
Legenda terá graves dificuldades de retórica no próximo ano, véspera das eleições gerais
O PT terá graves dificuldades de retórica no próximo ano, véspera das eleições gerais. Até duas semanas atrás, a pedra de toque dos discursos de seus parlamentares, fora e dentro do Congresso, era a crítica inteiramente justificada ao neoliberalismo. Agora, porém, o partido ficou de pernas para o ar depois que Lula assumiu abertamente, em entrevista ao New Yorker, na Ásia, que já nos anos 80 aprendeu com Margareth Thatcher e Ronald Reagan que “a Globalização e o “livre comércio” são bons para todos.
Com isso, se o Partido continuar atacando o neoliberalismo, estará atacando os fundamentos ideológicos de seu próprio líder, na medida em que “globalização” e “livre comércio” são as bases do pensamento neoliberal e antinacionalista. Se não atacar, é seu discurso que vai para o ralo. Se ficar calado, haverá sempre quem, como eu, cobrará a incoerência entre o discurso dele e a confissão pública de Lula na entrevista durante sua visita recente à Ásia. Em suma, se foi sincero, e creio que foi, Lula deu com sua declaração um tiro direto no pé do PT.
Naturalmente, caso seja esperta, a oposição vai explorar essa contradição na campanha eleitoral. No caso dela, não há incoerências entre base e cúpula: ambas se complementam num sistema onde a característica principal, nas bases, é a sujeição à manipulação dos eleitores ignorantes por demagogos, enquanto, na cúpula, o principal objetivo é roubar o povo, aprovando no Congresso emendas parlamentares e projetos que só interessam ao andar de cima, sem qualquer elo com a população enganada.
O fato é que o PT, como a oposição, nunca conseguiu apresentar ao país um projeto nacional sólido no Brasil por falta de visão estratégica. Quando isso acontece, as fissuras partidárias se dão por razões secundárias ou pela disputa de poder interna, como ocorre hoje. Seus integrantes nunca dialogaram com o povo para definir as bases do desenvolvimento nacional. Como o resto das cúpulas partidárias, eles se limitam à retórica e, no caso do PT especificamente, por causa de sua situação de minoria no Congresso, a única coisa que faziam e fazem é protestar contra o neoliberalismo. Agora nem isso podem fazer diante da conversão neoliberal confessa do seu líder maior.
Os integrantes do PT, assim como os situacionistas em geral, tem sido incapazes até mesmo de tentarem uma mobilização popular contra o bolsonarismo, deixando aos seguidores do pior ex-presidente do Brasil a iniciativa de levar às ruas de Brasília uma multidão de fanáticos pela anistia aos criminosos pelo 8/1 – como aconteceu recentemente. Era de se esperar que, sem maioria parlamentar, a mobilização de rua compensasse de alguma forma sua fragilidade no Congresso, quando menos pela repercussão que pudesse ter na imprensa.
É por tudo isso que, depois da entrega de Lula ao neoliberalismo, reforçamos nossa convicção de que o Brasil, para se desenvolver, não pode esperar nada de cima para baixo. As comunidades e os territórios têm que se organizar de baixo para cima, se quiserem ter os frutos econômicos e sociais do crescimento econômico. Isso significa mobilizar as comunidades em torno de Arranjos Produtivos Locais e Regionais (APLs), com economia circular, a exemplo de quase 90 que já existem no Brasil.
A ocupação de territórios de grande potencial econômico é a trilha para a retomada do desenvolvimento sustentável de baixo para cima. Os Arranjos Produtivos Locais, como célula mater desse processo, integram trabalhadores e investidores em unidades produtivas que podem se auto sustentar, por causa de sua alta eficiência e produtividade. Quando dotados de alta tecnologia, como plataformas digitais que acompanham o processo produtivo em tempo real, especialmente na agricultura, atendem a custo baixo as necessidades de consumo não apenas internas, mas da própria sociedade do entorno, com sobras para exportação.
Outro efeito produtivo de grande potencial econômico num APL é a integração, nele, de investimentos na agricultura, sabidamente de alto retorno, com investimentos em energia elétrica autônoma, limpa, produzida “de graça” na etapa operacional de seus sistemas produtivos pelo sol, o vento e as águas. Isso possibilitará que uma rede de APLs, organizados pelo setor privado, sem necessidade de intervenção direta dos governos, contribua de forma decisiva para o fim da fome no mundo e o resgate de setores da sociedade hoje marginalizados pelo desemprego ou o subemprego, e que podem ser integrados em sua estrutura.
No âmbito de um grande projeto onde o APL seja o elemento básico, acreditamos que possa ser enfrentada até mesmo a questão da segurança pública, hoje o principal desafio das nossas metrópoles. O crime organizado – assim como o crime “desorganizado” – se beneficiam da omissão do Estado diante das graves mazelas sociais que afetam a Sociedade. Se líderes comunitários assumirem a liderança de um movimento local para o combate ao crime, a prevenção, no lugar apenas da repressão, poderá criar efeitos benéficos e permanentes.
É claro que podem surgir criminosos mesmo no interior de um APL bem organizado e atento às necessidades econômicas e sociais de seus integrantes. Contudo, serão facilmente identificados, porque estarão fora das estruturas produtivas e societárias do Arranjo. Isso os tornará vulneráveis à ação preventiva e repressiva da polícia. A Sociedade se mobilizará para exigir dos poderes públicos, especialmente do Estado, que estabeleça instituições oficiais bem estruturadas para cuidar da segurança repressiva, já que este último não é o papel de um APL.
Uma das características mais óbvias do fracasso dos poderes públicos em combater o crime, organizado ou não, é a ausência de construção de presídios. Enquanto, nos últimos anos, a criminalidade cresceu vertiginosamente em nossas metrópoles, isso não foi acompanhado da construção de cadeias. Numa grande metrópole, como o Rio, onde o crime praticamente domina a sociedade, a Justiça mandou recentemente que duas centenas de menores infratores fossem soltos das casas de detenção por falta de vagas, efetivamente os induzindo a voltar ao crime.
Um presídio modelo, num APL, consistiria numa estrutura que abrigasse criminosos de baixa e de alta periculosidade. Os primeiros se beneficiariam da participação em atividades de ressocialização ou de emprego remunerado, inclusive na agricultura, e seriam integrados às comunidades e às famílias, usando tornozeleiras eletrônicas. Já os condenados por crimes hediondos teriam de cumprir penas máximas de 40 anos de reclusão em regime fechado, previstas em lei, nas alas específicas a eles destinadas nos Arranjos.
Todas essas questões, especialmente a de segurança pública em razão da situação de hoje em nossas metrópoles, deveriam ser consideradas num grande projeto nacional desenvolvimentista. Os partidos políticos, e principalmente o PT, por causa de sua proximidade do Poder central, tinham e tem obrigação de enfrentá-las. Preferem, entretanto, a demagogia barata, onde oportunistas bancados pelo dinheiro público apresentam suas plataformas demagógicas na televisão sem qualquer conteúdo, como se fossem bonecos propagandistas de sabonete. Que o PT se vire, portanto, para conciliar sua demagogia vazia com a sinceridade ingênua de seu chefe.
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