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      Sara York

      Sara Wagner York ou Sara Wagner Pimenta Gonçalves Júnior é bacharel em Jornalismo, licenciada em Letras Inglês, Pedagogia e Letras vernáculas. Especialista em educação, gênero e sexualidade, primeiro trabalho acadêmico sobre as cotas trans realizado no mestrado e doutoranda em Educação (UERJ) com bolsa CAPES, além de pai, avó. Reconhecida como a primeira trans a ancorar no jornalismo brasileiro pela TVBrasil247.

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      Livre no Carnaval, censurado na parada: o corpo que crianças podem ver

      Enquanto crianças assistem sem escândalo a corpos seminus e erotizados no Carnaval, manifestações LGBTQIAPN+ seguem sendo alvo de censura

      Parada LGBTI de São Paulo (Foto: EFE/Fernando Bizerra Jr.)

      As arquibancadas do Carnaval - símbolo da cultura popular brasileira - estão repletas de crianças. Ali, corpos seminus dançam em coreografias marcadas por erotização, baterias pulsantes e fantasias provocantes. É espetáculo. É tradição. É Brasil… 

      Mas quando a cena se desloca para a Parada do Orgulho LGBTI+, algo muda. Corpos que dançam, protestam e celebram a diversidade sexual e de gênero se tornam, de repente, impróprios. O que é arte no Sambódromo, vira "conteúdo de impacto psicológico" nas avenidas da cidadania. Essa moral seletiva acaba de ganhar respaldo institucional: uma manifestação da Procuradoria-Geral da República, no âmbito da ADPF 7.584/AM, defende a constitucionalidade de leis estaduais que restringem a participação de crianças e adolescentes em eventos LGBTQIAPN+.

      O parecer do Ministério Público Federal analisa leis que, sob o pretexto de "proteger o desenvolvimento psicossocial de menores", proíbem sua presença em manifestações LGBTI+. Segundo o texto, tais leis seriam compatíveis com a Constituição Federal, pois não invadem competências da União e visam proteger crianças de "conteúdos considerados impróprios". Em outras palavras, a defesa da infância - princípio constitucional legítimo - é mobilizada seletivamente contra corpos dissidentes e manifestações que desafiam a heteronormatividade. Nenhuma linha, porém, menciona as crianças que assistem a trios elétricos com letras de teor sexual, a blocos onde corpos femininos são mercadoria visual ou a transmissões televisivas de escolas de samba em horário nobre. E eu sigo avó e travesti perguntando será que posso ar a rua com meu netinho?

      A pergunta inevitável: que corpos são permitidos às crianças brasileiras?

      A resposta, ainda que silenciosa, grita: os normativos, os que performam feminilidade ou masculinidade dentro do esperado. Os brancos, os cisgêneros, os comercializáveis. Quando corpos LGBTI+ ocupam o espaço público, especialmente com afeto, orgulho ou denúncia política, tornam-se "ameaça". A erotização imposta à população LGBTQIAPN+ pelo olhar cisheteronormativo se volta contra nós: somos acusados de mostrar demais, mesmo quando lutamos apenas por existir.

      Bem disfarçada de proteção, está a exclusão!

      A justificativa do MPF de que essas restrições não são abusivas nem discriminatórias ignora o impacto simbólico de dizer às crianças LGBTI+ que suas existências são perigosas demais para serem vistas. Que o orgulho deve ser escondido. Que sua família - se for composta por duas mães, dois pais, ou por uma travesti - não é digna de ser celebrada em público.

      Direitos de quem? Direitos para quem?

      A Constituição garante a liberdade de expressão, de reunião e de manifestação. Também assegura a proteção da infância. O desafio constitucional é harmonizar esses princípios - não usá-los seletivamente para reforçar exclusões históricas.

      Proibir crianças de estarem em eventos LGBTQIAPN+ não é proteger: é reproduzir uma lógica de silenciamento. É declarar que o afeto entre duas pessoas do mesmo sexo é mais traumático que um comercial de cerveja às 10h da manhã. É afirmar que uma travesti de mãos dadas com sua companheira causa mais dano do que a exposição rotineira a machismo, racismo e violência simbólica.

      O que está em jogo?

      Não se trata apenas da presença de crianças em eventos. Trata-se de qual sociedade estamos construindo. Uma sociedade que naturaliza a hipersexualização feminina e a masculinidade tóxica, mas censura o amor e a diversidade, está em dissonância com os direitos humanos e com a própria ideia de infância plural.

      Se a preocupação é com a proteção das crianças, o debate deve ser outro: como oferecer espaços de convivência onde a diversidade seja apresentada com respeito, onde a cidadania não seja condicionada à heteronormatividade e onde as crianças possam crescer sabendo que o mundo é múltiplo - e que isso é bom.

      Porque censurar a Parada LGBTI+ enquanto se aplaude o Carnaval não é cuidado. É moralismo seletivo. E esse, sim, é um risco grave ao desenvolvimento das futuras gerações.

      * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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